Páginas

domingo, 31 de janeiro de 2016

Uma noite na ópera
































Cinquenta anos. Foi o tempo que levou para que eu finalmente fosse assistir uma ópera. Não que eu seja conhecedor ou grande fã do gênero (na verdade gosto de pouca coisa além das de Wagner). No ano passado cogitamos de assistir a alguma de Verdi na ópera de Madrid, mas enquanto decidíamos os ingressos se esgotaram. Quais são as dúvidas? Em primeiro lugar o receio de não valer a pena. Soma-se os altos preços (ou a pouca visibilidade nos ingressos mais baratos), e o receio de não ter roupa adequada para comparecer ao evento.

Decidimos em março comprar ingressos para La Traviata. É uma das óperas menos interessantes, aquela coisa romântica-xaroposa das óperas italianas de Verdi, mas era o que havia para a época. Os ingressos variavam entre 14 e 316€. Optamos pelos mais baratos sabendo que a visibilidade seria zero. Era uma questão de poder conhecer o belo Liceu de Barcelona por dentro, ouvir a música e sentir o prazer de espetáculos ao vivo. Quanto ao vestuário não consegui indicação nenhuma segura de como se trajar. Fiquei apenas com a convicção de que em pleno verão, com sol a prumo, um calor acima de trinta graus, eu imaginei de que boa parte iria de roupa casual. Quanto às três horas de show decidimos, se não gostássemos, iríamos ao fim do primeiro ato e valeu a experiência.

Chegamos quase uma hora antes e já havia uma filazinha. De fora deu para ver que ternos e longos seriam a exceção. Conforme confirmamos ao longo da noite, a maioria se veste como se estivesse indo a uma pizzaria ou barzinho no sábado à noite. Mesmo na cara plateia havia um senhor de bermudas e sapatênis. Uma ou outra perua parecia estar lá para exibir roupa nova.

O jovem que conduzia as pessoas aos lugares nos levou a assentos errados e depois tivemos que trocar de lugar. O casal gay que deveria sentar onde estávamos foi meio hostil comigo, como se tivesse propositadamente querendo lhes surrupiar os lugares. Fiquei meio aborrecido com a descortesia. Brasileiro é mais gentil e simpático nestes equívocos.

Para nossa grande surpresa, nas filas onde a visibilidade é zero há monitores que transmitem o evento (com legendas em catalão, castelhano e inglês, era somente escolher!)

Independentemente do tema (a paixão de duas pessoas da nobreza, já casadas com terceiros, o dilema entre convenções sociais e o amor) a qualidade do que assisti me tornou fã. A audição é impecável e todos os cantores são fora do comum. E mais: diversas pessoas que estavam em filas como a nossa, com zero de visibilidade, simplesmente se levantavam e podiam ver tudo de pé. Foi o que fiz, sem prejudicar a visão de ninguém. Após o primeiro ato uma pequena parte do público foi embora (já pensou, dar dezenas de euros para não ver tudo?). Nós queríamos era mais. Fomos ao foyer onde algumas pessoas tomavam champanhe (10€ a taça) e pedimos uma garrafa de água mineral (€1,70).

Havia todo tipo de público (catalão, muito poucos estrangeiros), famílias com filhos adolescentes, jovens universitários com ar descolado, e alguns idosos com pinta de frequentadores assíduos. Infelizmente, apesar dos repetidos avisos, havia os mal-educados com celulares e tabletes ligados, um saco, neste ponto Barcelona é (quase) igual ao Brasil.